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Apenas em 2021, 125 km² da Amazônia foram devastados pela mineração. A área representa um aumento de 62% em comparação com a atingida em 2018. Foto: Chico Batata/Greenpeace

Meio Ambiente

Desmatamento por mineração na Amazônia bate recorde e cresce 62% no governo Bolsonaro

22.02.2022 09:28 0

Reportagem Em
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A devastação provocada pela extração de minérios na Amazônia atingiu seu recorde histórico em 2021, conforme aponta o relatório Cumplicidade na Destruição IV, divulgado nesta terça-feira (22) pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) em conjunto com a organização Amazon Watch. Ao todo, foram desmatados 125 km² de floresta amazônica ao redor de minas: marca 62% maior do que a registrada em 2018, ano anterior ao governo Bolsonaro.

A marca atingida apenas em 2021 chega a representar mais de um quarto de toda a devastação provocada pela mineração no bioma amazônico ao longo dos cinco anos anteriores, em que o Sistema de Detecção do Desmatamento em Tempo Real (Deter) registrou uma área de mais de 405 km². Esses números, no entanto, estão subestimados pois se referem apenas ao impacto direto da atividade nos locais onde a floresta é cortada para a exploração mineral. Estudos afirmam que operações minerais de grande escala na Amazônia podem gerar um desmatamento até 12 vezes maior do que a área oficialmente concedida à exploração.

Com base nos dados do sistema Deter, a Amazon Watch e a Apib alertam que, apesar desses números não chegarem a eclipsar o impacto deixado pela agricultura extensiva e pela pecuária, eles já apontam para uma rápida expansão do impacto deixado pelas mineradoras na região. O documento também ressalta que esse impacto é subdimensionado, uma vez que imagens de satélite não permitem identificar o dano localizado abaixo das copas das árvores, como a devastação deixada com a construção de estradas e pequenas estruturas.

O relatório também demonstra que florestas localizadas dentro ou próximas de áreas de demarcação indígena são os principais alvos da mineração na Amazônia. Uma verificação feita pelas duas instituições no dia 5 de novembro, no sistema da Agência Nacional de Mineração (ANM), demonstrou que o órgão havia recebido mais de 2,4 mil pedidos de extração mineral sobrepostos a 261 terras indígenas. Destes, aproximadamente mil são para buscar ouro.

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Extremidades de terras indígenas e de reservas naturais são principais áreas de interesse da mineração na Amazônia. Foto: divulgação Apib e Amazon Watch

 

Impacto na vida indígena

Segundo a assessora de campanhas da Amazon Watch no Brasil, Rosana Miranda, a extração mineral em áreas próximas de terras indígenas impacta diretamente a vida local. “Temos impactos vinculados à perda de cobertura florestal, à contaminação de cursos d’água, contaminação do solo, contaminação das pessoas que se utilizam dos recursos naturais no entorno das minas. É uma atividade que não passa despercebida”, apontou.

O dano deixado pela mineração em grande escala não ocorre apenas durante o período em que a atividade é exercida, mas se estende pelas décadas seguintes. “As consequências disso permanecem por muito tempo. Temos o exemplo de Minas Gerais, onde as barragens deixadas por minas que nem são mais operacionais representam risco até hoje. Um risco que acaba sendo assumido pelo Estado e pela sociedade como um todo”, destaca.

A situação se agrava quando se calcula o impacto deixado especificamente em terras indígenas. “Estamos falando de territórios de altíssima biodiversidade, que concentram cerca de 80% da biodiversidade do planeta. São terras com uma cobertura de florestas muito alta, e que acabam se tornando chaves ao se pensar o futuro do planeta em questões como equilíbrio climático e mudanças climáticas”, explicou.

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Além dos problemas ambientais deixados pela mineração, Rosana Miranda alerta para os danos deixados ao próprio estilo de vida das comunidades indígenas. “Esses povos vivem de forma indissociável aos seus territórios. Eles dependem desses territórios para a sua sobrevivência política, cultural e social. A entrada da mineração nesses territórios resulta em rupturas e fragmentações que nunca mais voltam a ser como antes. Podemos estar diante de mais uma etapa do genocídio indígena pela indústria extrativista”, declarou.

Veja a íntegra do relatório

Interesse governamental

A expansão da mineração na região amazônica foi uma das principais pautas do discurso eleitoral de Jair Bolsonaro em 2018. Além de fomentar o setor, Bolsonaro também procura agora legalizar a prática do garimpo na Amazônia, chegando a criar um programa de estímulo à prática, renomeada pelo governo de “mineração artesanal”.

Segundo Rosana Miranda, o interesse de Bolsonaro no setor não veio por acaso. “O governo é o principal fiador desse setor, então tem uma rede de interesses econômicos. O próprio presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), se beneficiou da prática nas eleições, quando foi possível receber doações de pessoas jurídicas, com o recebimento de doações de empresas vinculadas à economia do garimpo”.

Dinamam Tuxá, ativista indígena e coordenador jurídico da Apib, acrescenta que há também um forte interesse político do governo ao se aproximar das mineradoras. “A bancada da mineração no Congresso Nacional é muito forte, e está incidindo sobre as decisões do presidente. Há uma troca de ações e interesses: não só o presidente como a bancada cooperam em procurar atender metas em comum”, declarou.

Lira, a propósito, é citado no relatório. De acordo com o levantamento, em 2014, última eleição em que foram autorizadas doações de pessoas jurídicas, o deputado recebeu R$ 200 mil da Rico Táxi Aéreo, empresa prestadora de serviços a garimpeiros na Amazônia.

O líder indígena vê com preocupação o Projeto de Lei 191/2020, de autoria do próprio governo. O texto cria normas para permitir não apenas a extração mineral em reservas indígenas, como também a exploração de rios e a utilização desses para a construção de usinas hidrelétricas.

A justificativa adotada pelo governo para implementação do projeto é o desenvolvimento da região e, nos termos da proposta, o “usufruto de terras indígenas”. Tuxá alerta que o projeto não considera o tamanho do dano que o projeto pode causar. “Estamos falando de uma área de 3 milhões de hectares em risco pelo projeto.”

A assessoria de comunicação de Arthur Lira foi contatada pela reportagem para se manifestar sobre as citações ao seu nome no relatório, mas, até o momento, não houve resposta. O espaço permanece aberto, e a matéria será atualizada caso haja manifestação.

O Congresso em Foco procurou o Ministério do Meio Ambiente e a Casa Civil para comentarem o assunto. A reportagem será atualizada caso haja manifestação das pastas.

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