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Bruno Araújo terá hoje a espinhosa tarefa de tentar convencer João Doria a desistir da sua candidatura em nome do apoio à senadora emedebista Simone Tebet. Foto: Divulgação

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Por que a terceira via não vinga

20.04.2022 09:19 0

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A terceira via não “vinga” porque falta candidato com identidade e valores claramente diferentes dos dois principais concorrentes. Falta projeto coletivo ou partidário para formá-la e musculatura social.

No campo do centro à extrema direita, se encontra Bolsonaro, com o peso da máquina do governo federal e identidade marcada pelo conservadorismo reacionário. No campo do centro à esquerda, encontra-se o ex-presidente Lula, com identidade marcada por ideias progressistas e pela defesa de uma democracia plural. Lula abocanha ainda um pedaço do centro-direita, conta com o recall de realizações em dois mandatos e com a força de um partido que tem capilaridade nacional.

Com um pouco de história, vamos tentar explicar por que os partidos importam, e o que isso tem a ver com a asfixia da terceira via.

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O partido da pré-candidata Simone Tebet, que já foi MDB, virou PMDB, e voltou a ser MDB, é aquele que no pós-ditadura agregava diversos grupos de oposição ao regime militar. O MDB original, de Tancredo Neves e Ulysses Guimarães cumpriu à época um papel importante na transição democrática. Com o fim do bipartidarismo e diante de dissidências internas, o MDB deu origem no final da década de 1980 ao PSDB, liderado por Fernando Henrique Cardoso, Mario Covas e Franco Montoro. Mas, ao longo do processo de redemocratização, que ainda está em curso, o MDB foi abdicando de disputar o governo federal, focando nas eleições para o Parlamento e se transformando numa espécie de “Partido do Governo”.

O PSDB seguiu cumprindo uma trajetória histórica com posições, identidade e objetivos claros, conquistando por duas vezes a presidência da República com Fernando Henrique, além do governo e da prefeitura de São Paulo em quase todos os mandatos até a atualidade. Porém, o PSDB tem tido um comportamento político muito semelhante ao do MDB. Apesar do “outsiderJoão Doria querer ser o candidato e ter vencido nas prévias, o próprio votou e se elegeu na mesma onda, e com as mesmas identidades que Bolsonaro; rompeu com ele posteriormente, mas, não conseguiu cumprir com um dever de casa básico, que é a união e o controle do próprio partido. Apesar da máquina do governo de São Paulo nas mãos, há diversos integrantes do PSDB que estão dentro do governo Bolsonaro e apoiam sua reeleição abertamente ou “por baixo do pano”.

O PDT, herdeiro do trabalhismo getulista, surgiu liderado por Leonel Brizola. Atualmente, Ciro Gomes é o líder que tenta se acoplar a esse perfil. Mesmo nutrido de identidade ideológica orientada pela centro-esquerda, acaba sendo ofuscado pela hegemonia do PT neste campo político do qual já fez parte como ministro. Além de não possuir máquina administrativa a seu favor, enfrenta dificuldades com a estratégia de “bater” em Lula e Bolsonaro ao mesmo tempo, colecionando rejeição em ambos os lados que predominam no espaço político da disputa.

O PT nasceu no período da redemocratização, liderado por Lula, e congregando grupos como o movimento sindical, as comunidades eclesiais de base da igreja católica, setores da educação e saúde e movimentos sociais. Depois de diversas derrotas, conquistou a presidência por quatro vezes, além de cidades importantes pelo país. Tem capilaridade nacional que vem de suas raízes e quadros próprios para gestão. Passou por turbulentos escândalos, mas, com a Lava Jato desmascarada em seu viés político, voltou a recuperar credibilidade. Lula, seu líder maior, permanece liderando as pesquisas e agregando forças partidárias da esquerda ao centro direita.

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Quanto à questão partidária, Bolsonaro é um caso à parte, que se projeta em um contexto de crise. Após perambular por diversos partidos, chegou ao poder acoplado a um deles, o PSL, onde estavam agregados os signos de uma cultura política autoritária, identificada e com o suporte dos militares; há quem reconheça, inclusive, a existência informal de um partido militar. Bolsonaro apareceu nacionalmente, de modo semelhante a Doria, como “outsider“, se colocando à parte da política e dos políticos, mas, foi rapidamente abduzido pela política real e entregou-se ao Centrão, de onde foi oriundo, com o aval dos militares que lhe dão sustentação.

O PSL, ex-partido de Bolsonaro, foi empacotado a vácuo por um grupo político que tem DNA semelhante, formando o partido União Brasil, que lança uma candidatura à presidência, a de Luciano Bivar, sem nenhuma chance de eleição.

Percebam agora um fato importante: o União Brasil, nasceu da fusão do PSL com o DEM. E quem era o DEM? Era a legenda que abrigava o mesmo grupo do PFL. E quem era o PFL? Era o partido oriundo do PDS, que veio da Arena. E quem era Arena? A Arena foi o partido emprenhado e parido pelo braço civil da ditadura militar.

O partido União Brasil, que é a “Nova Arena”, depois de passar por muitas metamorfoses, é também o partido que hoje mantém como inquilino o ex-ministro de Bolsonaro Sergio Moro, que, de última hora, abandonou Curitiba, para tentar um domicílio eleitoral fraudulento em São Paulo, abandonou o partido Podemos, que investiu R$ 2 milhões do fundo partidário em sua pré-campanha e consequentemente foi mais um nome da terceira via que naufragou.

O PSD de Gilberto Kassab, que também foi oriundo de desdobramentos de parte do PFL/DEM, tentou emplacar a candidatura do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, que desistiu. Depois, tentou a de Eduardo Leite, ex-governador do Rio Grande do Sul, do PSDB, sem sucesso. Mas, o PSD tem oscilado como uma biruta de aeroporto, semelhante ao MDB, em termos comportamento político. Sem identidade própria, já apoiou Dilma e Temer e agora, poderá apoiar Lula ou Bolsonaro.

Portanto, a terceira via não “vinga”, porque os principais partidos que dizem tentar construí-la, exceto o PDT, ou não têm a coragem de largar as tetas do governo Bolsonaro por estarem repletos de parlamentares ocupando cargos, recebendo emendas via orçamento secreto e votando com o governo; ou, têm apostado na perspectiva de poder de Lula e nutrem expectativas de ocupar espaços em seu futuro governo.

A terceira via não “vinga”, porque não há projetos coletivos de nação, nem vínculos com partidos que possuam vida orgânica. Aliás, são projetos tão pessoais que cabem em qualquer partido e, portanto, não têm identidade coletiva nenhuma. Não “vinga”, porque não se construiu uma liderança de expressão nacional.

É necessário muito tempo até que novos personagens surjam, consigam conhecer o Brasil e se tornarem conhecidos por ele; igualmente, não se constrói um partido com organicidade e capilaridade do dia para a noite. Além disso, as trajetórias e os valores expressos pelos políticos ao longo de suas carreiras, também importam e estão sendo avaliadas.

Por fim, a terceira via não “vinga” porque faltam desprendimento e disposição de ceder para somar, e sobram fisiologismos e jogos de vaidades entre personagens das elites políticas, que ignoram as conexões com o povo. Falta imersão, empatia, cheiro de povo e disposição contínua para rodar o Brasil fora dos períodos de campanha. Interpretar corretamente o que a população precisa, é necessário para que esse conhecimento genuíno se traduza nas políticas públicas que o Brasil precisa para se tornar uma nação de fato.

O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para [email protected].

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