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Moro será superministro da Justiça e promete “agenda anticorrupção”, mas não escapa de críticas

Moro aceitou convite para ser ministro da Justiça

Moro vai deixar a Lava Jato e o cargo de juiz depois de 22 anos de magistratura[fotografo]ABr[/fotografo]

Quatro dias após sua eleição, o presidente eleito Jair Bolsonaro conseguiu emplacar sua primeira grande vitória. O juiz federal Sérgio Moro, que conduz a Operação Lava Jato em primeira instância, será o seu ministro da Justiça e Segurança Pública. Por causa de suas ações à frente da maior operação policial da história do país, Moro virou referência mundial no combate à corrupção e ídolo popular no Brasil, a despeito das críticas que recebe de petistas e juristas.

Moro se reuniu com Bolsonaro, por cerca de 1h30 nesta manhã, na casa do presidente eleito na Barra da Tijuca, no Rio, onde aceitou o convite para ocupar o cargo. Logo após o encontro, o magistrado divulgou uma nota explicando por que decidiu abandonar a magistratura após 22 anos para assumir o ministério em Brasília.

Veja a íntegra do comunicado:

“Fui convidado pelo Sr. Presidente eleito para ser nomeado ministro da Justiça e da Segurança Pública na próxima gestão. Após reunião pessoal na qual foram discutidas políticas para a pasta, aceitei o honrado convite. Fiz com certo pesar pois terei que abandonar 22 anos de magistratura. No entanto, a perspectiva de implementar uma forte agenda anticorrupção e anticrime organizado, com respeito à Constituição, a lei e aos direitos, levaram-me a tomar esta decisão.

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Na prática, significa consolidar os avanços contra o crime e a corrupção dos últimos anos e afastar riscos de retrocessos por um bem maior. A Operação Lava Jato seguirá em Curitiba com os valorosos juízes locais. De todo modo, para evitar controvérsias desnecessárias, devo desde logo afastar-me de novas audiências. Na próxima semana, concederei entrevista coletiva com maiores detalhes. Curitiba, 01 de novembro de 2018. Sergio Fernando Moro.”

Logo após a divulgação do comunicado, Bolsonaro confirmou o nome de seu quinto ministro nas redes sociais. “Sua agenda anti-corrupção, anti-crime organizado, bem como respeito à Constituição e a às leis será o nosso norte!”, escreveu no Twitter. O economista Paulo Guedes (Economia), o deputado Onyx Lorenzoni (Casa Civil), o astronauta Marcos Pontes (Ciência e Tecnologia) e o general Augusto Heleno (Defesa) são os outros ministros já anunciados. O convite ao juiz, segundo o vice-presidente eleito, general Hamilton Mourão, foi feito ainda durante a campanha eleitoral por meio de Guedes.

“Sua agenda anti-corrupção, anti-crime organizado, bem como respeito à Constituição e a às leis será o nosso norte!”, escreveu o presidente eleito no Twitter.

Dupla vitória

A confirmação de Moro como ministro da Justiça e Segurança Pública representa uma grande vitória para o presidente eleito. Por um lado, atrai para o seu governo um magistrado que virou ícone, ressalvadas as polêmicas, no combate à corrupção – principal bandeira da campanha de Bolsonaro. O presidente eleito já abriu a possibilidade de o magistrado assumir vaga no Supremo Tribunal Federal, mas ele é encarado também como opção para a eleição presidencial de 2022, uma vez que Bolsonaro antecipou que não pretende disputar a reeleição.

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Por outro lado, a saída de Moro da Lava Jato causa alívio a empresas, políticos e outros agentes públicos investigados na megaoperação, que deve perder força ao menos na primeira instância. A maior parte das ações já julgadas por ele segue no Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Mas há casos que estão e outros que poderiam chegar às suas mãos em breve. Hoje, por exemplo, parlamentares que não conseguiram a reeleição estão sujeitos a ter seus processos enviados para a capital paranaense assim que terminarem seus mandatos em decorrência da perda do foro privilegiado.

O esvaziamento da Lava Jato na primeira instância foi um objetivo perseguido sem sucesso, nos últimos quatro anos, por políticos que queriam “estancar a sangria”, a exemplo do senador Romero Jucá (MDB-RR) e outras lideranças dos últimos dois governos (Dilma e Michel Temer).

Questionamentos

Ao aceitar o convite, porém, Moro dá munição aos críticos de sua atuação. Ele será lembrado como o juiz que mandou o ex-presidente Lula para a cadeia, o tirou da eleição, divulgou a delação de Antonio Palocci durante a campanha presidencial e, por fim, passou a integrar o governo do candidato mais beneficiado com suas decisões. Esse ponto é explorado não apenas por petistas e aliados, mas também já pela imprensa estrangeira, como destacou nesta quinta-feira o jornal britânico The Times ao anunciar o seu ingresso no futuro governo.

A migração de Moro para o governo Bolsonaro intensificará o discurso do PT contra as decisões do juiz que levaram à prisão do ex-presidente Lula. O partido sempre alegou que o magistrado persegue, com propósitos políticos, o ex-presidente. A defesa vai pedir a suspeição dele. Moro comentou sobre essa possibilidade durante a viagem de Curitiba para Brasília. Disse que tudo será resolvido na Justiça.

Um dos elementos que reforçaram a munição de petistas e demais opositores de Moro foi produzido pelo próprio juiz. Em 5 novembro de 2016, quando o país já estava no terceiro mês após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), o jornal O Estado de S. Paulo veiculou a seguinte manchete: “‘Jamais entraria para a política’, diz Sérgio Moro”. Era um domingo, dia 6 daquele mês (publicada também no site, na véspera), dia tradicional para a leitura mais demorada de jornais impressos.

Mudança de juiz

O juiz tinha audiência marcada para interrogar o ex-presidente Lula no próximo dia 14 no processo do sítio de Atibaia (SP), no qual o presidente é acusado de ter recebido propina da Odebrecht, da OAS e do pecuarista José Carlos Bumlai em forma de obras no imóvel. Também está previsto para as próximas semanas o julgamento da ação penal em que o ex-presidente é acusado de ter recebido um imóvel para o Instituto Lula como propina da Odebrecht. Os casos, porém, ficarão a cargo de outro magistrado.

Depois do convite ao juiz, antes mesmo de ele aceitar o cargo, os advogados de defesa do ex-presidente ingressaram ontem, em Curitiba. com um pedido de nulidade do processo relativo ao Instituto Lula movido pelo Ministério Público Federal por prática de lawfare (uso das leis e dos procedimentos jurídicos para fins de perseguição política) agravada pela “conexão política” entre o juiz e Jair Bolsonaro.

“É o lawfare na sua essência, uma vez que Lula sofre uma intensa perseguição política por meio do abuso e do mau uso das leis e dos procedimentos jurídicos”, diz trecho de nota assinada pelo advogado Cristiano Zanin Martins (leia íntegra abaixo).

Moro embarcou por volta das 6h30 de Curitiba portando um livro sobre medidas contra a corrupção. Em entrevista a duas repórteres da GloboNews e da TV Globo que estavam no mesmo avião, Moro disse que o país precisa de uma política nacional anticorrupção.

“O país precisa de uma agenda anticorrupção e uma agenda anticrime organizado. Se houver a possibilidade de uma implantação dessa agenda, convergência de ideias, como isso vai ser feito…”, disse. O juiz não detalhou quais seriam os principais pontos dessa agenda.

Superpoderes

Moro deverá ser o ministro da Justiça mais poderoso da história recente do país. O superministério oferecido ao paranaense contempla as estruturas da Justiça, da Segurança Pública, da Transparência e Controladoria-Geral da União e do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Este último, importante instrumento no combate à lavagem de dinheiro, integra hoje o Ministério da Fazenda.

Ao chamar Moro, Bolsonaro pretende reforçar o discurso de combate à corrupção que o ajudou a se eleger. O presidente eleito quer dar carta branca para o juiz atuar no enfrentamento do crime organizado e da lavagem de dinheiro. Se for confirmado no ministério, Moro terá poder para inibir o tráfico de drogas e armas nas fronteiras e sobre a Polícia Federal, hoje no Ministério da Segurança Pública.

No governo, o juiz terá força para articular politicamente com o Congresso a aprovação do pacote de 70 propostas de combate à corrupção produzido pela Fundação Getúlio Vargas e a Transparência Internacional.

Na última segunda-feira (29), em entrevista a TVs, o presidente eleito disse que convidaria o juiz para ser seu ministro da Justiça e estendeu o convite para que ele venha a ocupar uma cadeira no Supremo Tribunal Federal assim que surgir uma vaga. Um dia após a oferta, Moro afirmou que, se o convite fosse oficializado, seria “objeto de ponderada discussão e reflexão”.

Nota da defesa de Lula:

A formalização do ingresso do juiz Sérgio Moro na política e a revelação de conversas por ele mantidas durante a campanha presidencial com a cúpula da campanha do Presidente eleito provam definitivamente o que sempre afirmamos em recursos apresentados aos tribunais brasileiros e também ao Comitê de Direitos Humanos da ONU: Lula foi processado, condenado e encarcerado sem que tenha cometido crime, com o claro objetivo de interditá-lo politicamente.

É o lawfare na sua essência, uma vez que Lula sofre uma intensa perseguição política por meio do abuso e do mau uso das leis e dos procedimentos jurídicos.

A Defesa tomará as medidas cabíveis no plano nacional e internacional para reforçar o direito de Lula a um julgamento justo, imparcial e independente.

Cristiano Zanin Martins

 

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