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A partir do impeachment de Dilma, o país literalmente dividiu-se. Foto: Juca Varella/Agência Brasil.

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O foco não é a guerra, é Bolsonaro, estúpido!

07.03.2022 07:40 0

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A invasão da Ucrânia pelas tropas de Vladmir Putin está produzindo uma significativa perda de foco das oposições em relação ao alvo principal e que deveria ser preocupação de todo dia, dia e noite com as respectivas madrugadas: o enfraquecimento de Bolsonaro e seu desgoverno, para  inviabilizar sua reeleição, já que o Congresso se omitiu e por isso as chances de impeachment se esvaíram.

Ao acompanhar a movimentação nas redes sociais, percebe-se uma redução visível das postagens críticas a Bolsonaro. É como se a guerra de Putin tivesse o condão de varrer pra baixo do tapete a guerra suja de Bolsonaro contra as instituições e os alicerces democráticos.

Parece que a fumaça dos blindados de Putin criou uma barreira que impede a visão das atrocidades que o governo vem cometendo em velocidade acelerada. Neste momento, o Brasil é o paraíso sonhado pelo ex-ministro da Destruição do meio Ambiente, Ricardo Salles, na malfadada reunião ministerial de 22 de abril de 2020, quando defendeu que o governo aproveitasse a  pandemia para “passar a boiada”. Ou seja, aprovar leis que favorecessem o agronegócio mesmo a custo da saúde do meio-ambiente.

A guerra de Putin conseguiu obnubilar a pandemia. À sombra do noticiário da destruição da Ucrânia, a “boiada” achou a porteira aberta e está passando. Basta ver a pouca vergonha com que a base governista aprovou à sorrelfa, com pouca ou nenhuma repercussão, um pacote que amplia assustadoramente a quantidade de agrotóxicos liberados para uso na agricultura. Batizado pela oposição de “pacote do veneno”, a medida é um desastre para o meio ambiente. A Associação de Saúde Coletiva – Abrasco – advertiu que a medida facilita o registro de substâncias tóxicas, inclusive cancerígenas. E acusa Executivo e Legislativo de se de se esquecerem da saúde e do meio ambiente, desmontando e perseguindo ambientalistas, lideranças de povos e comunidades tradicionais e até mesmo os órgãos de fiscalização. Na mesma pisada, como se diz no meu Piauí, Bolsonaro está prestes a cumprir uma de suas promessas de campanha, abrindo as terras indígenas para exploração econômica, reivindicação vinda principalmente de garimpeiros e empresas de exploração mineral, ação vista com preocupação pelas comunidades indígenas. O líder do governo na Câmara, Ricardo Barros, não teve o menor pudor de requerer, inclusive, urgência para a votação do projeto que afrouxa as regras de exploração mineral em terras indígenas.

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Tudo sob o aval de Bolsonaro, num vídeo anexado ao pedido de urgência, em que o capitão-presidente põe um doce na boca dos indígenas ao afirmar que eles poderão se dar bem se concordarem com a exploração dos recursos minerais de seu subsolo. A posição de Bolsonaro é secundada por seus apoiadores que colocam as atuais restrições à mineração em terras indígenas na conta de “um discurso meramente ideológico”, como frisou o vice-líder do governo, deputado Evair de Melo, para quem a questão é de “soberania”. Noutras palavras: o meio-ambiente que se dane. O negócio é faturar.

O ataque à Ucrânia está causando morte, destruição e, até este momento, mais de meio milhões de refugiados em fuga. Mas, por aqui, a boiada está passando. E Bolsonaro se cacifando para seu segundo mandato, haja vista a elevação de sua aprovação popular, ainda que pequena, pois que ainda dentro da margem de erro, nas pesquisas de opinião. Há pouco mais de uma semana, o STF deu uma mãozinha pra segurar a porteira aberta, ao decidir pela manutenção dos quase 5 bilhões de reais a serem torrados na campanha eleitoral. Enquanto o mundo derrete com a preocupação pelos efeitos da guerra em plena pandemia, Bolsonaro passeia de jet-ski em Guarujá. E se alguém pensa que essa imagem cola negativamente nele está enganado. Fernando Collor, 30 anos atrás, faturou uma imagem de dinamismo e otimismo ao se deixar fotografar montado num jet-ski no Lago Paranoá. Claro que isso não impediu seu impeachment mas, à época, surtiu o efeito desejado. Bolsonaro não deixou por menos. E ainda esnobou quem o criticou pela folga: “se achar que não devo sair de folga, não vote em mim”.

Dentro do próprio cenário do conflito, Bolsonaro faturou uma imagem de “estadista”, ainda que fajuta na visão de seus opositores, ao visitar em pleno limiar do conflito a melhor vocação de Stálin do século XXI, o presidente russo Vladmir Putin. O mesmo Ricardo Salles tentou, numa fake news ridícula distribuída pelas redes sociais, colocar uma fotomontagem de Bolsonaro na capa de uma revista famosa, na condição de candidato ao Prêmio Nobel da Paz. E quem, como eu, criticou essa imbecilidade, foi duramente atacado pelos mínions como sabotador do “esforço de paz empreendido por sua excelência na viagem à Rússia etc., etc., etc.”

Em síntese: nada contra os que se preocupam com a guerra e seus efeitos. É um conflito que pode colocar o mundo diante do risco de uma convulsão inimaginável. Por envolver uma superpotência que dispõe de armamento nuclear, a situação merece, sim, atenção e preocupação, embora não tenhamos muito o que fazer por aqui, talvez, no máximo, participar de algum protesto, que, sabemos, não causará maiores efeitos.

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Mas é bom não esquecer, em momento algum, que existe um risco “nuclear” bem próximo de nós: a possibilidade de o eleitorado apertar o botão vermelho e catapultar Bolsonaro para um segundo mandato. Os efeitos radioativos dessa explosão são, apenas,  assustadores.  Mas, se não podemos fazer muito para conter a ofensiva russa sobre a Ucrânia, essa explosão doméstica nós podemos, sim, evitar. Desde que as oposições responsáveis não esmoreçam na concentração de forças para evitar a “catástrofe nuclear bolsonarista” advinda da permanência dele naquela cadeira do Palácio do Planalto.

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