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Valentina e Simone de Beauvoir

11.11.2015 08:00 0

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É difícil adjetivar um pedófilo. Chamá-lo de imoral, criminoso, bandido, canalha ou do que mais​ se​ queira, é pouco. Pouco porque não há um adjetivo condizente para esta desumanidade. Portanto​,​ escrever um artigo criticando um criminoso, bandido, imoral, canalha e seja lá o que mais for, é tarefa difícil.

Quando li os comentários que foram feitos contra Valentina, uma criança de 12 anos, fiquei ​​desconcertado​,​ pensando sobre o que deveria fazer. O que deveria escrever. Só sei de uma coisa: se fosse o pai da Valentina​,​ denunciaria todos os pedófilos e cobraria da polícia ​uma ​ação concreta de investigação e punição. Não ficaria quieto enquanto isso não ocorresse. Sou sincero: sei que me cansaria. Mas não daria paz aos que devem investigar.

Chegamos onde chegamos ​em termos ​de racismo e agressividade de gênero e de violência contra as crianças devido a um Estado inoperante​.​ No caso da pedofilia e da violência contra a mulher, além de inoperante​,​ é um Estado machista.

A nossa cultura é machista. Não bastasse​ o fato de​ todos (homens) sermos machistas, muitas mulheres também o são. Esse fermento machista construiu um Estado machista, por isso permissivo em relação ​à​ violência contra a mulher e incapaz de elaborar políticas públicas de promoção da igualdade de gênero e de prevenção da violência. Por mais vontade que tenha o governante, a m​á​quina estatal machista não executa as políticas decididas.

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O machismo não est​á​ só na agressão física; est​á​ no assobio na rua, no passar de mão, no comentário com o amigo, no olhar de desejo, nas piadas, enfim​,​ em todo ato desrespeitoso em relação a uma mulher​. No caso da Valentina, por sua idade, além d​o​ machismo, ​está caracterizada a ​pedofilia.

Li várias matérias sobre a agressão de que Valentina foi vítima e​,​ numa delas​,​ est​á​ explicitado que “os pais da menina não foram autorizados pela emissora a comentar o assunto”. Deixar claro, a emissora é a Band. E o que a Band tem para nos dizer?

Abr​a-se​ a cortina: comentário rápido. A matéria também é machista ao afirmar que “os pais…”; ora, porque não explicitar que o pai e a mãe de Valentina foram persuadidos pela Band a nada fazerem? Fecha​-se​.

Nesse “MasterChef​ ​Júnior”, nome do programa que a emissora levou ao ar, participam crianças de 9 a 13 anos de idade. Certo que​,​ para participarem​,​ o pai e a mãe de​ram​​ uma autorização.

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O contrato de autorização assinado, se não tem, deveria ter cláusulas responsabilizando a emissora por qualquer dano ​à​ imagem da criança exposta. E que​,​ se forem vítimas de qualquer agressão (Valentina é o exemplo), cabe​ria​ à emissora a responsabilidade pela contratação de advogados para que os danos ​fossem reparados.

Valentina foi agredida. Seus agressores merecem punição e sua imagem deve ser repara​da​. Mas a situação vai além desse momento: como ter certeza de que​,​ no futuro​,​ Valentina não terá algum trauma psicológico? Aliás, como ter certeza ​de ​que​,​ no futuro​,​ algumas dessas crianças, seja por receberem cr​í​ticas ou mesmo elogios, não sofrerão psicologicamente alguma consequência?

Em consequência da agressão sofrida por Valentina​,​ centenas de mulheres​,​ estimuladas por uma ​​hashtag​,​ decidiram contar a violência que sofreram na infância. A violência é mais corriqueira do que se imagina​,​ e vem de onde menos se espera: de dentro da família e dos amigos.

A agressão a Valentina é um retrato do Brasil atual: violência contra jovens e crianças (pedofilia) e violência contra a mulher. Os que os cometem são os mesmo que criticaram o tema da redação do ​Enem: “A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”. Tema atual num país que assassina uma mulher a cada duas horas e violenta milhares a cada hora.

Os mesmos beócios criticaram também o E​nem deste ano pela inclusão de uma questão na prova de ​C​iências H​umanas. A prova trouxe uma pergunta usando uma frase de Simone de Beauvoir: “Não se nasce mulher; torna-se mulher”.

Sim, torna-se mulher. Se no dia-a-dia muitos têm que “matar um leão” por dia​ ​para se tornar alguém, a mulher​,​ além de “matar um leão por dia”​,​ tem que “matar um machista” por dia.

Valentina já aprendeu que essa frase de Simone de Beauvoir é para valer.

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É difícil adjetivar um pedófilo. Chamá-lo de imoral, criminoso, bandido, canalha ou do que mais

​ se​

queira, é pouco. Pouco porque não há um adjetivo condizente para esta desumanidade. Portanto

​,​

escrever um artigo criticando um criminoso, bandido, imoral, canalha e seja lá o que mais for, é tarefa difícil.


Quando li os comentários que foram feitos contra Valentina, uma criança de 12 anos, fiquei

​​

desconcertado

​,​

pensando o que deveria fazer. O que deveria escrever. Só sei de uma coisa, se fosse o pai da Valentina

​,​

denunciaria todos os pedófilos e cobraria da polícia

​uma ​

ação concreta de investigação e punição. Não ficaria quieto enquanto isso não ocorresse. Sou sincero: sei que me cansaria. Mas não daria paz aos que devem investigar.


Chegamos onde chegamos

​em termos ​

de racismo e agressividade de gênero e de violência contra as crianças devido a um Estado inoperante

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No caso da pedofilia e da violência contra a mulher, além de inoperante

​,​

é um Estado machista.


A nossa cultura é machista, não bastasse

​ o fato de​

todos (homens) sermos machistas, muitas mulheres também são. Este fermento machista construiu um Estado machista, por isso permissivo em relação

​à​

violência contra a mulher e ‘incapaz’ de elaborar políticas públicas de promoção da igualdade de gênero e de prevenção da violência. Por mais vontade que tenha o governante, a m

​á​

quina estatal machista não executa as políticas decididas.


O machismo não est

​á​

só na agressão física, est

​á​

no assobio na rua, no passar de mão, no comentário com o amigo, no olhar de desejo, nas piadas, enfim

​,​

em todo ato desrespeitoso em relação a uma mulher

​. N

o caso da Valentina, por sua idade, além d

​o​

machismo,

​está caracterizada a ​

pedofilia.


Li várias matérias sobre a agressão a que Valentina foi vítima e

​,​

numa delas

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est

​á​

explicitado que “os pais da menina não foram autorizados pela emissora a comentar o assunto”. Deixar claro, a emissora é a Band. E o que a Band tem para nos dizer?


Abr

​a-se​

a cortina: comentário rápido. A matéria também é machista ao afirmar que “os pais…”, ora, porque não explicitar que o pai e a mãe de Valentina foram persuadidos pela Band a nada fazerem. Fecha

​-se​

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Neste “MasterChef

​ ​

Júnior”, nome do programa que a emissora levou ao ar, participam crianças de 9 a 13 anos de idade. Certo que

​,​

para participarem

​,​

o pai e a mãe de

​ram​
​ uma

autorização.


O contrato de autorização assinado, se não tem, deveria ter cláusulas responsabilizando a emissora por qualquer dano

​à​

imagem da criança exposta, e que

​,​

se forem vítimas de qualquer agressão (Valentina é o exemplo), cabe

​ria​ à

emissora a responsabilidade pela contratação de advogados para que os danos

​fossem

reparados.


Valentina foi agredida. Seus agressores merecem punição e sua imagem deve ser repara

​da​

. Mas a situação vai além deste momento: como ter certeza de que

​,​

no futuro

​,​

Valentina não terá algum trauma psicológico? Aliás, como ter certeza

​de ​

que

​,​

no futuro

​,​

algumas dessa crianças, seja por receberem cr

​í​

ticas ou mesmo elogios, não sofrerão psicologicamente alguma consequência?


Em consequência da agressão sofrida por Valentina

​,​

centenas de mulheres

​,​

estimuladas por uma 

​​

hashtag

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decidiram contar a violência que sofreram na infância. A violência é mais corriqueira do que se imagina

​,​

e vem de onde menos se espera: de dentro da família e dos amigos.


A agressão a Valentina é um retrato do Brasil atual: violência contra jovens e crianças (pedofilia) e violência contra a mulher. Os que os cometem são os mesmo que criticaram o tema da redação do

​Enem

: “A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”. Tema atual num país que assassina uma mulher a cada duas horas e violenta milhares a cada hora.


Os mesmos beócios criticaram também o E

​nem

deste ano pela inclusão de uma questão na prova de

​c​

iências

​h​

umanas. A prova trouxe uma pergunta usando uma frase de Simone de Beauvoir: “Não se nasce mulher, torna-se mulher”.


Sim, torna-se mulher. Se no dia a dia muitos tem que “matar um leão” por dia

​ ​

para se tornar alguém, a mulher

​,​

além de “matar um leão por dia”

​,​

tem que “matar um machista” por dia.


Valentina já aprendeu que esta frase de Simone de Beauvoir é para valer.

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