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Incêndio no Pantanal[fotografo]Mayke Toscano/Secom-MT[/fotografo]

Saiba por que o Brasil pega fogo. Spoiler: “índio” é inocente

23.09.2020 11:34 33
Atualizado em 26.09.2020 12:19

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O presidente Jair Bolsonaro falseou a realidade ao minimizar os incêndios na Amazônia e no Pantanal e ao atribuir a “ índios e caboclos” a responsabilidade pelo aumento da propagação das queimadas, que viraram alvo de pressão política e econômica internacional. Crise criada, segundo ele, por uma “campanha de desinformação” com objetivos econômicos.

As declarações dadas pelo presidente no pronunciamento de abertura da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas nesta terça-feira (22) ignoraram o que a ciência já comprovou: a relação entre desmatamento, provocado na maioria das vezes pela grilagem de terras, pela exploração ilegal de madeira e pelo garimpo, e os incêndios criminosos. Na visão de especialistas ouvidos pelo Congresso em Foco, o discurso negacionista de Bolsonaro degrada a imagem do país lá fora, incentiva práticas criminosas e inviabiliza a solução do problema.

“Ele esconde o problema feito avestruz. Faz o discurso de copo meio cheio, chamando de antipatriótico quem está querendo proteger o Brasil. Quem é patriota: quem defende a ciência e a verdade ou quem esconde os problemas que temos de controle sobre incêndio e pandemia?”, questiona o presidente do Instituto Democracia e Sustentabilidade (IDS), Ricardo Young, que também já comandou o Instituto Ethos.

Rastro de destruição

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Animais são vítimas de incêndio criminoso em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Foto: Lula Marques/Fotos Públicas

Nessa terça-feira (22) o Pantanal superou a marca de 16 mil focos de incêndio em 2020, o maior número de queimadas desde 1998, desde que o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão do governo federal, começou a registrar os dados. Na comparação com todo o ano passado, em apenas nove meses houve um aumento de 61%. Estima-se que mais de 15% do bioma tenha sido destruído. Operação da Polícia Federal constatou que o fogo na região foi provocado deliberadamente para transformar a mata nativa em pastagem para o gado. Situação agravada pelo período de seca na região.

Entre janeiro e agosto de 2020, 3,4 milhões de hectares, uma área equivalente a 22 vezes a cidade de São Paulo, queimaram na Amazônia. Do total, 83% ocorreram em áreas recentemente desmatadas, de acordo com números apontados pela bióloga e doutora em Ecologia pela Unicamp Ludmila Rattis, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), organização não governamental científica.

Incêndios criminosos

Peritos criminais na Operação Amazônia Viva, em agosto. Foto: CPCRC

Um dos cientistas brasileiros mais reconhecidos internacionalmente, por causa de seus estudos sobre o aquecimento global, o climatologista Carlos Nobre é taxativo: a quase totalidade dos incêndios no Sul da Amazônia e no Pantanal, principais motivos de preocupação de ambientalistas atualmente, é provocada de maneira criminosa. Isso diferencia a situação do Brasil, por exemplo, dos incêndios florestais ocorridos em países como Austrália e Estados Unidos, onde a maioria tem causas naturais ou é resultado de acidentes.

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Incêndios no Sul da Amazônia e no Pantanal são criminosos, alerta Carlos Nobre. Foto: Reprodução

No Brasil, segundo o professor, o cenário é inverso: “Poucos são acidentais. Descargas elétricas são muito raras nestas condições super secas. Como colocar fogo está proibido por lei este ano, todos os fogos iniciados por humanos – talvez menos um pequeno percentual que é acidental – são criminosos”, disse Carlos, ex-pesquisador do Inpe, ao Congresso em Foco.

“O número de focos que podem ser indiretamente associados à limpeza de pastos e de resíduos agrícolas é menor que 20% da área incendiada. E a maioria dos incêndios de pequenas propriedades de comunidades tradicionais e até populações indígenas estão dentro destes 20%, ainda que a maioria seja em grandes propriedades”, explica o cientista.

Segundo ele, somente uma pequena parte dos incêndios vem do uso tradicional do fogo por comunidades tradicionais. “Eles têm experiência no uso do fogo e raramente perdem controle dos incêndios. Quase 80% da área queimada na Amazônia vêm de grandes áreas desmatadas e do fogo dentro da floresta”, diz o pesquisador, doutor em Meteorologia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT).

Bolsonaro mente e distorce informações pelo menos 15 vezes em discurso na ONU

Terras indígenas

Focos de incêndio são proporcionalmente menores em terras indígenas, aponta Impa

Estudo feito pelo Ipam mostra que apenas 7% dos focos de incêndio na Amazônia, em 2019, ocorreram em terras indígenas, que ocupam mais de 20% da região. O percentual apurado contraria o trecho do discurso de Bolsonaro em que ele atribui aos indígenas a responsabilidade pelo aumento das queimadas.

“Isso mostra que os indígenas não são os principais agentes do fogo, apesar de sabermos que eles também usam fogo em sua prática agrícola, como todos os demais no Brasil. Metade desses focos ocorreram em cinco terras indígenas pressionadas pelo garimpo, pela exploração madeireira ilegal ou invasão”, destaca a geógrafa Ane Alencar, diretora de Ciência do Ipam.

Na aldeia Kuikuro, o fogo começou com as queimadas realizadas dentro de fazendas no entorno da terra em MT. Foto: Takumã Kuikuro/Fotos Públicas

Neste ano, 31% dos incêndios e 42% do desmatamento na Amazônia ocorreram em terras públicas, ressalta Ane. “Isso é ilegal e deveria ser combatido, porque é patrimônio público. É a ação de grileiros, é a ocupação de terra pública por agentes que querem tornar essas terras privadas”, observa a geógrafa.

Floresta úmida

Em discurso para a ONU, Bolsonaro minimizou as queimadas na Amazônia, alegando peculiaridades de sua vegetação. “Nossa floresta é úmida e não permite a propagação do fogo em seu interior. Os incêndios acontecem praticamente, nos mesmos lugares, no entorno leste da floresta, onde o caboclo e o índio queimam seus roçados em busca de sua sobrevivência, em áreas já desmatadas”, afirmou o presidente.

Veja o vídeo do discurso dele:

O cientista Carlos Nobre constata que, apesar da umidade citada por Bolsonaro, a floresta amazônica está mais vulnerável ao fogo. “Cerca de 30% da área identificada como tendo pegado fogo é de florestas em pé, com o fogo consumindo a vegetação no solo, um valor muito alto, indicando que a floresta Amazônica, que é historicamente úmida e resiliente ao fogo, está ficando mais e mais vulnerável ao fogo”, afirma.

Essa mudança, segundo o professor, deve-se a vários fatores. “O do clima vem da severidade das secas e do aumento da temperatura que torna a biomassa mais inflamável. E a degradação florestal aumenta a penetração da radiação solar, secando mais a floresta e a tornando também mais inflamável”, explica.

Agronegócio

Ricardo Young: Bolsonaro se faz de avestruz ao tentar esconder problema. Foto: Reprodução

Para Ricardo Young, Bolsonaro desperdiçou uma oportunidade de defender o agronegócio brasileiro internacionalmente ao isentar completamente os produtores rurais dos incêndios na Amazônia e no Pantanal durante seu pronunciamento. “Ele deveria dizer que o agronegócio é responsável, mas que entre os produtores também há criminosos. Jogou para cima do indígena e do caboclo toda a responsabilidade”, criticou o fundador do IDS.

Na avaliação de Carlos Nobre, o uso do fogo na agropecuária brasileira é uma prática anacrônica. “Não é algo compatível com a agricultura moderna do século 21. O excessivo uso do fogo para expandir as áreas da agropecuária é na maioria das vezes ilegal. Há que melhorar muito a fiscalização e principalmente educar o agropecuarista a não usar mais o fogo”, defende.

Acordo sob ameaça

Criticado, Salles perdeu gerência sobre questões da Amazônia para Mourão. Foto: Antonio Cruz/ABr

O agronegócio brasileiro tem sofrido ameaça de sanções internacionais por causa da política ambiental conduzida pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles. O receio do setor é de ser impedido de exportar determinados produtos como represália.

Governos da França, da Alemanha e da Irlanda ameaçam não endossar o acordo entre a União Europeia e o Mercosul caso o Brasil não assuma compromissos com o manejo florestal sustentável. Em resposta à manifestação dos franceses, o Itamaraty e o Ministério da Agricultura divulgaram ontem nota na qual acusam os europeus de adotarem o discurso como prática protecionista para defender os seus interesses comerciais.

Na semana passada uma carta assinada por embaixadores de oito países europeus (Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Holanda, Noruega, Dinamarca e Bélgica) também alertou o governo Bolsonaro de que o “Brasil está tornando cada vez mais difícil para empresas e investidores atender a seus critérios ambientais, sociais e de governança”.

Impunidade

Mourão atribui críticas a interesses comerciais de outros países. Foto: Romério Cunha/VPR

Na avaliação da diretora de Ciência do Ipam, o combate ao desmatamento e aos incêndios depende da combinação entre comando e controle. “É preciso que áreas ilegais sejam embargadas, equipamentos sejam destruídos e pessoas, presas. Os criminosos precisam ter a sensação de que, se fizerem coisa errada, serão punidos. Hoje reina uma sensação de impunidade muito grande”, considera Ane Alencar. “O problema está aí para todo mundo ver. Não estamos mais nos anos 90.”

Dados oficiais mostram que o governo tem reduzido a aplicação de multas ambientais, desestruturado órgãos de fiscalização como o Instituo Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) e o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) e reduzido a aplicação de recursos em medidas preventivas.

Dinheiro guardado

A rubrica controle de fiscalização ambiental do Ibama perdeu quase 35% de seu orçamento: dos R$ 102,8 milhões de 2019 para R$ 66,2 milhões de 2020. A verba para prevenção e controle de incêndios florestais recuou de R$ 45,9 milhões anuais para R$ 38,6 milhões este ano, queda de 16%. No ICMBio, a área de fiscalização ambiental e prevenção e combate a incêndios florestais perdeu 48,6% de sua previsão orçamentária de 2019 para 2020.

Ane Alencar: “Não adianta tentar calar as instituições e dizer que quem denuncia é mau brasileiro”. Foto: Reprodução

No ano passado o Ministério do Meio Ambiente deixou de executar R$ 3,3 bilhões de seu orçamento, ou 39% do total. O ministro Ricardo Salles também abriu mão de ajuda internacional para preservação da Amazônia. O episódio repercutiu mal dentro e fora do país. Em maio deste ano o vice-presidente Hamilton Mourão reverteu a decisão do ministro de renunciar a recursos do bilionário Fundo Amazônia, constituído por doações internacionais lideradas pelos governos da Noruega e da Alemanha.

No fim de agosto, Salles foi novamente enquadrado por Mourão, depois de ter anunciado que as operações de contra desmatamento e queimadas na Amazônia e no Pantanal estavam suspensas por causa de boqueio de R$ 60 milhões na pasta determinado pela equipe econômica. No mesmo dia, o vice-presidente negou o core e o ministro teve de voltar atrás.

A exemplo de outras áreas, o governo tem investido na militarização no combate aos incêndios. A Operação Verde Brasil 2, liderada por Mourão, mobiliza 4 mil militares e custa R$ 60 milhões mensalmente.

Para Ane Alencar, do Ipam, a maior contribuição que o governo pode dar hoje e ao agronegócio é o inverso do discurso feito pelo presidente para a ONU. “É reconhecer e enfrentar a ação de grupos criminosos. O agronegócio hoje está sob risco porque os compradores exigem selo e têm medo do risco reputacional por causa das condições do Brasil”, afirma. “É importante que as pessoas entendam que não é escondendo o problema que ele vai deixar de existir. Não adianta tentar calar as instituições e dizer que quem denuncia é mau brasileiro. Se governo se posicionasse, dizendo que está enfrentando o problema não teríamos de passar por essa crise”, acrescenta a geógrafa, doutora em Recursos Florestais e Conservação pela Universidade da Flórida.

Bolsonaro faz discurso ambiental falso em Assembleia da ONU

33 respostas para “Saiba por que o Brasil pega fogo. Spoiler: “índio” é inocente”

  1. Rodrigo Homer disse:

    Imagine…foi a esquerda, juntamente com os índios e o pessoal da Rede Globo que atearam fogo lá. Fazendeiros latifundiários, jamais! Marte é o planeta vermelho, creio que muitos comunistas têm vindo de lá. Mas graças a Deus, nosso líder supremo vai proibir citar o planeta vermelho nos livros escolares, kkkkkkkk

  2. Marcos Adriano Marcello disse:

    Que estrangeiros critiquem o Brasil, se entende porque há décadas (senão séculos), que estão de olho em nossa Amazônia, por suas riquezas minerais e de bioma riquíssimo… como se explica a existência até os dias atuais, de colônias de potências europeias no continente.
    E ONG’s mantidas por capital estrangeiro, nas aldeias doutrinando os idiotas úteis.
    Agora, brasileiros falando mal de seu país, é nojento.
    Fora que esses esquerdistas tiveram mais de 30 anos de desgovernos para criarem mecanismo de proteção nas áreas, e nada fizeram…. e agora querem creditar a responsabilidade em um Governo eleito democraticamente!
    Eles ainda estão vociferando pela perda das eleições, ainda estão no palanque de 2028… e as cretinices que falam… os incautos acreditam…
    Quem é de origem pantaneira, como eu, sabe bem o comportamento dos indígenas de há muitos séculos… está arraigado na “tradição” deles, e agora posam de “santos”…. gente cínica… cretinos!

  3. ALMANAKUT BRASIL disse:

    Fogo amigo, estudos mostram que a prática indígena de queimar grandes áreas de cerrado é benéfica para o bioma – (A AXA surge em 2007 do encontro de dois processos sociais que aconteciam na região: a Campanha Y’Ikatu Xingu, trabalho compartilhado por diversas instituições para a recuperação das nascentes e matas ciliares da Bacia do Rio Xingu, que iniciava suas ações em Canarana (MT) em 2006, e, a atuação militante, desde a década de 1970, das organizações sociais nascidas ou inspiradas na Prelazia de São Félix do Araguaia (MT), principalmente a Comissão Pastoral da Terra (CPT), a Associação Nossa Senhora da Assunção (Ansa) e a Associação Terra Viva (ATV). – 2014)

    Além de inofensivas, queimadas controladas protegem a vegetação e a fauna locais, diz a reportagem.
    Por: Sofia Moutinho publicado em: Ciência Hoje

    SE HÁ ALGUÉM MAIS PERIGOSO PARA A SOCIEDADE COMUM DO BRASIL, É O ÍNDIO CORROMPIDO E VOLTADO PARA A CRIMINALIDADE.

    É MAIS PERIGOSO DO QUE UM JORNALISTA DA TV PLIM PLIM DO CAPETA, A MALDIÇÃO DE ROBERTO MARINHO, OU A FALIU DE S.PAULO, O ANTRO DOS FRIAS.

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    • Rodrigo Homer disse:

      Isso que vc tem, pega ou é de nascença?

      • ALMANAKUT BRASIL disse:

        Primeiro, aqui ninguém está contaminado por aquilo que teu pai e tua mãe fizeram na cadeia, durante uma visita íntima.

        Segundo, como aqui não é DITADURA comunista e vermelho não fala o que quer, sem ouvir o que não quer, a tua CAPIVARA é digna de ser resolvida naquele lugar o filho chora e a mãe não ouve.

        • Rodrigo Homer disse:

          É…poxa, hein. Esse era o momento que eu tinha que ficar com medo?? E esse desenho aí, mané? Por acaso anda com aqueles sujeitos de cabeça raspada metidos a valentes só qdo estão em bando e batem em guris com metade do tamanho deles? O presidente é o favorito de 11 a cada 10 dessa raça aí…

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